27 de setembro de 2010

Tá no Jornal do Dia

Ficha Limpa vale para o Amapá?


Com a indecisão sobre a Lei Ficha Limpa, muitos eleitores continuam indecisos quanto aos candidatos denunciados com base na legislação. Afinal de contas, vale a pena votar em um candidato que corre o risco de ser barrado?


Juristas que atuam na área eleitoral avaliam que a suspensão, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), do julgamento sobre a validade da Lei Ficha Limpa em 2010, traz “confusão jurídica” e explicam quais os cenários possíveis para a eleição. Se a aplicação da lei for votada e aprovada somente após a eleição, candidatos que foram considerados inelegíveis perderão a possibilidade de tomar posse. Em alguns casos, a Justiça Eleitoral pode ter que refazer as contas que determinam quantos deputados cada partido poderá eleger.


Alguns especialistas avaliam que como houve empate sobre se a lei deve ser aplicada já neste ano ou apenas na próxima eleição, o correto seria que a lei fosse considerada válida já no pleito de outubro. Outro especialista diz que o mais indicado seria esperar a nomeação do substituto do ministro Eros Grau, que se aposentou em agosto.


Diante da indecisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a aplicação da Lei da Ficha Limpa nas eleições deste ano, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Ricardo Lewandowski, afirmou que a lei está em pleno vigor e será aplicada “com rigor” pela Justiça Eleitoral.


No Amapá, cinco nomes estão sob risco de serem barrados pela lei. São eles: João Alberto Capiberibe (PSB), Janete Capiberibe (PSB), Jorge Souza (PCB), Charly Jhone (PSC) e Fran Júnior (PMDB).


Tanto João Capiberibe, quanto Janete e Jorge Souza foram impugnados por compra de votos. Aliás, o casal João e Janete entrou para a história política do país como sendo os primeiros casos de cassação parlamentar por compra de votos. Eles teriam pago R$ 26 a seus eleitores. Pior: de duas vezes.


O casal Capiberibe, Jorge Souza, Fran Junior e Chaly Jhone foram autorizados a disputar as eleições. Janete Capiberibe já teve sua candidatura barrada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ela recorreu ao STF (Supremo Tribunal Federal). Já o processo de João Capiberibe continua sendo analisado pelo TSE. A relatora do caso é a ministra Carmen Lúcia.


ENTENDIMENTO


A ministra Cármen Lúcia defendeu que a legislação sobre as novas regras de inelegibilidade, conhecida como Lei da Ficha Limpa, deve ser aplicada ainda este ano, e não apenas no próximo processo eleitoral.


Além de considerar que a moralidade pública está prevista na própria Constituição, Cármen Lúcia observou em seu voto que as novas regras de inelegibilidade não alteram o processo eleitoral. Ela relembrou que a incidência do princípio da anualidade “não é automática” e, portanto, a Lei da Ficha Limpa pode se aplicada em caráter imediato. “Probidade administrativa e moralidade são valores (...) autônomos, são valores constitucionais em si mesmo dignos de proteção”, disse, observando que “não incidirá o artigo 16 (que dispõe sobre o princípio da anualidade) se essa lei não contiver dispositivos que alterem o processo eleitoral, como me parece”. Ela relembrou ainda que há entendimento de que o princípio da anualidade tem por objetivo coibir o “casuísmo de véspera”, o que não é o caso da Ficha Limpa.


“A Lei da Ficha Limpa busca Assegurar a proteção ética do processo e o direito de votar em quem o sistema estabelece que tem as condições de elegibilidade. Os valores dos direitos dos cidadãos sobrepõem aos valores particulares. Sobrepõe-se, assim, à vontade pessoal de quem quer ser candidato a cargo público”, disse, negando qualquer possibilidade de ter havido ¿abuso do poder de legislar”.


Assim como o relator do processo, Carlos Ayres Britto, Cármen Lúcia rebateu os argumentos da defesa de Roriz sobre violação aos princípios da presunção de inocência e da irretroatividade da lei para prejudicar o réu. “Na renúncia no caso de Roriz não se leva em conta culpa ou inocência. Inelegibilidade não é pena. É uma restrição constitucional ou legal ao exercício de um direito político”, afirmou. “Não se tem direito adquirido a regimes de elegibilidade”, salientou a magistrada.


A ministra observou também que não cabe ao STF analisar uma suposta inconstitucionalidade formal na votação da Ficha Limpa, como defendeu o presidente do Supremo, Cezar Peluso, porque o caso não foi questionado no recurso hoje julgado. “Como se trata de tema de repercussão geral (que servirá de base para processos idênticos ainda a serem julgados) e como não se argüiu, era preciso dar à parte contrária a condição de manifestar. A introdução de um tema novo dessa gravidade não seria apropriada”, disse.


VALENDO


O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, também defendeu como representante do Ministério Público Federal, que a Lei da Ficha Limpa, em análise nesta tarde no Supremo Tribunal Federal (STF), não viola os princípios da anualidade, da irretroatividade de uma legislação, da presunção da inocência ou do ato jurídico perfeito. Os quatro pontos foram utilizados pela defesa do candidato do PSC ao governo do Distrito Federal, Joaquim Roriz, como argumentos para que o político não seja incluído nas regras de inelegibilidade previstas da legislação da Ficha Limpa.


Ao rebater as contestações de ofensa aos princípios da anualidade, da irretroatividade, da presunção da inocência, e do ato jurídico perfeito, Gurgel observou que a Lei da Ficha Limpa não alterou o cenário de disputa nas eleições de 2010, disse que a contestação sobre a retroatividade da lei não pode prosperar porque “inelegibilidade não é pena” e salientou que o princípio da presunção da inocência refere-se à esfera penal, e não a legislações eleitorais.


“Não se pode considerar que a lei complementar 135 Lei da Ficha Limpa tenha estabelecido algo que possa ser assemelhado a uma pena. Limitou-se a fixar um critério”, afirmou o PGR, completando que a renúncia de Roriz em 2007, considerada pela defesa como um ato jurídico perfeito, pode, sim, provocar efeitos na atualidade pelo fato de a Lei da Ficha Limpa criar condições para que políticos possam disputar cargos eletivos, e não penas contra fatos ocorridos no passado.


PARA 2010


O juiz eleitoral Márlon Reis, presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe), avalia que o mais correto seria considerar válido o julgamento do TSE. “Na nossa opinião, só falta proclamar o resultado porque houve vitória total da lei. A legislação prevê que, no caso de empate, deve prevalecer a lei.”


Reis explica que, caso a definição fique para depois de 3 de outubro, seria uma “ilegitimidade tremenda”. Outro ponto descartado pelo magistrado é aguardar a chegada de um novo ministro. “Nesse caso, o ministro entraria suspeito, e a aprovação seria política.”


Para o advogado Marino Pazzaglini Filho, autor de livro sobre a ficha limpa, não há insegurança com o adiamento da decisão. “Muito pelo contrário. Considero que o melhor seja analisar o tema com cautela.”


Pazzaglini Filho afirma ainda que, em toda eleição, há casos de candidatos com pendências judiciais. “No caso das eleições proporcionais, é só refazer o cálculo. Acho pode haver preocupação em relação às eleições majoritárias, porque o eleitor quer fazer valer seu voto.”


85% DA POPULAÇÃO APROVA FICHA LIMPA


Pesquisa Ibope feita sob encomenda da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) aponta que 85% dos eleitores aprovam a Lei da Ficha Limpa, que barra a candidatura de postulantes já condenados em órgãos colegiados.


O levantamento apontou, no entanto, que praticamente um em cada dez brasileiros ainda não conhece a lei. Apenas 3% da população disse ser contra a norma. O local onde a lei tem maior apoio da população são as regiões Norte e Centro Oeste: 91%. Entre quem tem ensino superior, o índice de apoio também chega a 91%.


A pesquisa, feita entre os dias 18 e 21 de agosto, ouviu 2.002 pessoas com o objetivo de conhecer os hábitos e atitudes do eleitor em relação ao processo de votação. O levantamento do Ibope apontou que 43% dos entrevistados conhecem casos de políticos que compram votos para se eleger. A maioria (56%) disse desconhecer a prática.


O índice de eleitores que conhecem pessoas que trocaram votos por benefícios é semelhante: 41%, contra 58% que afirmam desconhecer. A maioria dos entrevistados (85%) declarou não ter disposição para vender votos, contra 13% que afirmaram o contrário (o índice chega a 21% do Nordeste). A maioria dos eleitores, porém, diz que não denunciaria a prática: 54%, contra 41% que disseram que recorreriam a autoridades como a Justiça Eleitoral (43%) ou a polícia (24%) – a 14% disseram não saber a quem recorrer.


Para 73% das pessoas, segundo a pesquisa, o principal beneficiado da política é o próprio político; 42% disseram não concordar que a política seja benéfica para a população.

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