Por Cahê Mota Direto de Macapá (AP), Plácido de Castro (AC) e Rio Branco (AC)/GLOBOESPORTE.COM
A festa do futebol nacional é para todo mundo. Na teoria. É cada vez mais seleto o grupo dos que conseguem chegar ao salão principal. Maior competição do país pentacampeão do mundo, o Brasileirão vive franca ascensão com a economia cada vez mais forte e o retorno de craques da Europa. Por outro lado, o acesso ao escalão mais alto é cada vez mais restrito ao “vips”, e aqueles que sequer passaram pela porta de entrada tratam quase que como utopia o sonho de darem uma espiadinha na pista de dança. Casos de Acre, Amapá, Tocantins, Rondônia e Roraima, estados ainda virgens quando o assunto é a Série A.
Localizado na região Norte, o quinteto reflete em resultados uma realidade cada vez mais distante do luxuoso futebol da elite. Vítimas de um regime quase amador, os clubes destes estados estão praticamente fora do mapa da bola e veem até mesmo a Série C como uma meta difícil de ser alcançada. Com apenas um sobrevivente nas duas divisões mais baixas do Campeonato Brasileiro, eles tentam se reinventar para que, enfim, se apresentem ao país e digam: “Nós existimos”.
- É preciso repensar a forma como é conduzido o futebol, é preciso repensar o modelo de campeonato que queremos. Temos de potencializar as categorias de base. Esse é o começo. Mas tudo isso não passa somente pela federação. É preciso todo mundo trabalhar em conjunto para que esse sonho, que parece tão distante, se aproxime. Só assim seremos capazes – definiu o presidente em exercício da Federação Amapaense de Futebol (FAF), Paulo Roberto Rodrigues.
Os números deixam claro que muita coisa precisa mudar para que um novo horizonte se abra para estes estados. Único sobrevivente em 2011, com a classificação para a segunda fase da Terceirona, o Rio Branco, do Acre, é o responsável pela melhor campanha do quinteto virgem na história: um modesto 16º lugar na Série B de 89. Para os torcedores de Roraima e Rondônia (ambos que sequer disputaram a D este ano), além de Tocantins e Amapá, a realidade é ainda mais cruel: suas equipes nunca passaram da C.
Falta de investimento e profissionalismo travam progresso
Campeão tocantinense pelo Gurupi neste ano, o zagueiro Lucas, atualmente no Plácido de Castro (AC), apontou um dos fatores que pesam contra o estado: a falta de recursos financeiros. Com o futebol completamente fora do foco, empresários e até mesmo o poder público tornam os investimentos irrisórios, o que acaba travando o progresso.
- Falta incentivo de patrocinadores, empresários. É preciso ajudar esses estados que, mesmo desconhecidos no cenário nacional, têm grandes jogadores. Muitos às vezes não seguem carreira por falta de apoio. O próprio governo deveria ajudar um pouco mais.
Representantes do Tocantins nas Séries C e D do Brasileirão, Araguaína e Tocantinópolis terminaram a fase de classificação na lanterna de seus grupos, com o primeiro deixando o estado sem representante até mesmo na Terceirona. A nova realidade o coloca no mesmo patamar do Amapá, que contou apenas com o Trem em competições organizadas pela CBF.
A equipe do bairro que leva o mesmo nome exemplifica bem a realidade do futebol amapaense. Atual campeão, o Rubro-Negro do Macapá até difere de alguns clubes da região no quesito estrutura, com centro de treinamento próprio e sede social em boas condições, mas está longe de poder se dizer preparado para voos mais altos. A principal força local na atualidade conta com torcida basicamente resumida a moradores do bairro e familiares de seus mandatários, além de sofrer com questões financeiras.
Com os pés no chão, o diretor de futebol, Ronaldo Tavares, admitiu que sonhar com Série A ainda é impossível e apontou questões geográficas como empecilhos para o desenvolvimento.
- A série A é uma utopia. Pensar na Série C, talvez a B, é mais palpável. Sofremos muito com o preconceito do próprio Sul com o futebol do Norte, tanto culturalmente quanto financeiramente. É muito mais interessante que as competições mais importantes fiquem restritas ao Sul, Sudeste em sua maioria. Nós temos que fazer melhor uso do nosso voto, da nossa importância como federação. Em eleições, temos o mesmo peso de cariocas, paulistas, mineiros...
Futebol como cartão de apresentação ao resto do país
A disparidade atual do futebol de toda região Norte em comparação com o restante do país faz com que o treinador do Trem, Fran Costa, veja como difícil até mesmo o acesso de clubes de estados já com passagens pela elite.
- É muito complicado. Talvez, em uma realidade longínqua, Remo e Paysandu possam buscar representar o Norte, mas o restante é muito difícil. Hoje em dia, para chegar à Série B a dificuldade já é muito grande. Sonhar não custa nada, mas temos que ser realistas.
Para Paulo Roberto Rodrigues, presidente em exercício da Federação Amapaense, é preciso enxergar o futebol de uma forma mais global para que todos os setores da sociedade se unam em prol de uma volta por cima.
- O futebol é um produto que projeta um estado, projeta uma sociedade. É preciso enxergar isso. Só assim essa utopia poderá se tornar realidade. As autoridades precisam ter a dimensão da importância do futebol para o nosso país. É uma porta de entrada para o estado mostrar o que é capaz, mostrar as suas riquezas.
O dirigente, entretanto, faz um apelo para que a CBF torne a competição mais viável para estados menos favorecidos economicamente, e aponta a Copa do Brasil como única verdadeira competição nacional.
- O verdadeiro Campeonato Brasileiro é a Copa do Brasil, por dar oportunidade para todos os estados demonstrarem seu futebol. A Série A é restrita a quem tem poder financeiro, o resto não tem espaço. E se a CBF não mudar isso, tudo vai ficar mais difícil. É preciso voltar o olhar para as regiões menos favorecidas, dividir melhor os recursos. Hoje, não há igualdade.
Mais desenvolvido, Acre sonha com precaução
Um passo à frente do Amapá, a Federação de Futebol do Acre (FFA) analisa a situação por outro ponto de vista. Na opinião de Antônio Aquino, presidente do órgão, a demora para a profissionalização do futebol – o que aconteceu somente em 1989 - deixou o estado naturalmente abaixo de seus concorrentes.
- O futebol do nosso estado ainda está um pouco longe de lugares como Amazonas e Mato Grosso, apesar da situação atual deles ser pior. São estados que se profissionalizaram antes, ficaram prontos antes e participaram de competições de nível nacional por isso. Nós ficamos no amadorismo e só mudamos para o profissionalismo no fim dos anos 80, e por ser algo inevitável. Esse foi nosso grande problema.
O otimismo acreano é um pouco maior que o dos amapaenses. O sonho, por sua vez, é acompanhado de uma boa dose de precaução.
- Não resta dúvida de que é nosso maior sonho (chegar à Série A), mas primeiro temos que pensar em alcançar a Segunda Divisão. Só depois podemos fazer um trabalho bem organizado para tentar chegar à elite. Sabemos que é uma escala complicada, mas todos nós temos que sonhar.
E o número de virgens no Brasileirão pode crescer até o fim do ano, caso Tapajós e Carajás tenham sucesso em plebiscito marcado para o fim do ano no Pará e se tornem independentes. Enquanto isso, a Série A está restrita a nove estados (RJ, SP, MG, PR, RS, SC, GO, BA e CE) de um país que conta com 26, fora o Distrito Federal.
25 de setembro de 2011
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1 comentários:
Virgens para sempre!!! Bem verdade... Quem é o presidente da AFAP??? Por isso, vai continuar sempre virgem...
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